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Certa vez, havia um sapo que
vivia num charco com uma torre como vizinha.
Este parecia ser um sapo como
tantos outros, ele comia moscas, coaxava e saltava como todos da sua espécie.
Havia só uma pequena diferença. Acreditava ser o produto de um conto de fadas,
um príncipe preso no corpo de um sapo.
Não o sabia explicar bem, apenas
sentia-o.
Guardava esses pensamentos para
si, pois sabia que os outros diriam trombudos: “Não existem contos de fada.”
Se ainda não notaram, o nosso
amigo sapo tem uma imaginação fértil. No lugar da torre decrépita, conseguia
ver um castelo, cavaleiros, dragões e belas donzelas. Tolices, diriam todos na
sua família.
Certa noite, viu uma estranha luz
emanar do topo da torre e com ela a mais bela melodia que já tinha ouvido.
Seria este um sinal? Sim! Era tão
óbvio. Porque razão estaria ali uma torre, senão para fechar uma princesa
(pensou)?
No seu contentamento coaxou, mas
estacou assim que tudo ficou em silêncio. Teria amedrontado a sua amada? Mas
não, devagar, mas firme começou a cantar outra vez. E assim continuaram em simultâneo,
largas foram as noites.
Uma vez, com a lua cheia assistir,
o sapo pareceu confuso ao ver uma jovem humana na margem. Curioso, mas
cauteloso aproximou-se.
- És o meu príncipe? – Perguntou
ela.
O anfíbio olhou e viu os lençóis
pendurados pela torre. O seu coração pulou!
É sabido que as princesas nas
torres não estão verdadeiramente presas, meia dúzia de lençóis amarrados uns
aos outros e ficam livres por sua conta. Não, uma princesa numa torre não está
presa, mas á espera de ser resgatada.
Olhou a jovem outra vez. Tinha
grandes olhos (característica muito apreciada pelos sapos) e um cabelo encantado
que mudava consoante o seu humor.
- És o meu príncipe? – Perguntou outra
vez. Claramente sabedora dos contos de fadas.
O sapo anuiu. A princesa bateu
palmas, cresceu um sorriso e seu cabelo ondulou-se.
Consertou a voz, endireitou a
postura.
- Meu doce príncipe, parece que
estamos ambos a precisar ser resgatados.
Debruçou-se sobre ele, pegou-lhe
gentilmente e agiu com o melhor do seu conhecimento para o quebrar de um
feitiço com um beijo.
- Magia. Existe mesmo! – Palavras
invés do rouquejar.
A alegria da confirmação quase
que superava a maravilha da transformação.
Pernas longas, orelhas, dentes,
era agora um humano.
Sentiu-se tonto no entanto, tão longe
do chão. Não foi preciso muito tempo até tropeçar e cair. Um coro de vozes
ouviu-se do charco, já se sabe que é norma todos os que caem serem motivo de
chacota. O diferente é uma princesa de joelhos na lama a encorajar que alguém
se levante com um doce afagar na face.
Grandes olhos, grandes
expectativas, pareceu-lhe ver.
De pé novamente e sentiu-se
desconfortável, desta vez com as suas roupas espalhafatosas, cores alegres não lhe
pareciam combinar. Até a coroa lhe ficava torta tapando-lhe os olhos.
Foi aí que um terrível pensamento
se abateu sobre o nosso amigo: E se invés de um príncipe, fosse apenas e só, um
sapo que sonhava ser príncipe?
Tão rápida como a transformação
foi a regressão ao seu estado original. Medo é uma maldição poderosa, uma que
só pode ser vencida de dentro para fora.
O cabelo da princesa caiu liso. O
sapo fitou aqueles olhos grandes e ainda bem que já não podia falar (fungou).
E então o sapo rastejou para o
seu charco e a princesa subiu a sua torre.
A coroa mingou, mas permaneceu na
cabeça do sapo, que ficou para sempre como o sonhador que não se deixava viver seus sonhos.